Várias histórias acabam em pizza. De encontros entre colegas de trabalho até a impunidade de crimes do colarinho branco. Mas vale dizer que a história que vamos compartilhar iniciou com pizza.
Uma pizza conciliadora, uma pizza que levaria o espírito de um grupo que, com 10 anos de existência, passou por dezenas, talvez centenas de pizzas onde foram discutidas, brincadas, choradas e articulados assuntos, pessoas, projetos, espetáculos, apresentações para aquilo que hoje se torna um grupo que marcou a vida de seus integrantes e, porque não, de alguns que a assistiram.
Pode-se afirmar que uma história que é contada deve ter interesse coletivo, tratar de assuntos inerentes àquilo que toca a humanidade enquanto sua existência. E essa será mais uma delas. Porque um grupo de teatro é feito romanticamente e praticamente de seres humanos. O material do teatro é o ser humano.
Aquilo para que ele nasceu, se construiu, se consolidou e ainda existe é porque ele é capaz de transformar uma pessoa em algo melhor, mais inquietador, mais pensador, mais próximo da essência de algo que temos a impressão que perdemos ao longo da história do Homem.
E o Teatro da Neura nasce dessa paixão, desse encantamento.
O Teatro da Neura nasce principalmente de uma paixão. Ele nasce de um projeto imprescindível para a efervescência de jovens apaixonados pela vida, pelo amor, pelo outro, pela exposição, pela energia: ele nasce de um projeto chamado Passos da Paixão.
Idealizado pela Cia de Teatro Roda Mundo e produzido pela Associação Cultural Opereta desde 1999 na cidade de Poá, 40 km de São Paulo, o Passos das Paixão logo veio a se tornar um das principais ações artísticas da região do Alto Tietê porque vai trabalhar prioritariamente com jovens e adultos que, na sua maioria, tiveram nenhum ou pouco contato com teatro, para uma apresentação na rua da vida de Jesus Cristo.
Indo para além de uma história simples da vida de Cristo, será no processo desencadeado por Lidiane Santos e Marco Senna que o grande diferencial se dará: tratar todos como potencial para as artes e assim, tornar-se protagonista de sua própria história, própria paixão.
Batalha dura. Ganhando status de mega evento, chegou a atrair para as ruas mais de 12 mil pessoas sendo necessário estrutura de palco, som e iluminação na linha de grandes shows que a região ainda é habituada em trazer. Só que dessa vez, o show era a própria comunidade.
Com esse espírito quase que revolucionário, dezenas de jovens e adultos (algumas crianças que acompanham os pais nos ensaios, mais tarde se tornaram elenco dessas montagens) eram atraídos para as incrições que acontecem sempre no final de cada ano para que o processo de oficinas inicie logo em janeiro e culmine na apresentação na sexta feira santa.
Em 2002, o então ator da grupo Cotecos, Fernandes Junior decide ir assistir a peça. Só tinha ouvido falar da coisa e, cético de tudo quanto a esse tipo de espetáculo, cedeu ao fato de serem parceiros artistas e batalhadores da cidade que estavam produzindo e resolveu assistir a montagem também a convite de um bailarino que participaria do evento chamado Marcos Rosseli.
Então se dirigiu até Calmon Viana e um palco montado em frente a igreja ____________ assistiu a uma apresentação onde atores representando índios com apresentação de dança e um bebê em cena numa analogia ao nascimento de Jesus.
Diferente do que estava esperando, viu ali atores jovens, inexperientes mas com uma vontade incrível típica de gente amadora no melhor sentido da palavra. A partir daí ele pôde acompanhar a encenação da condenação de Jesus, com direito a Pôncio Pilatos e tudo mais. Da condenação, Jesus – naquele ano interpretado por Ailton Ferreira - pega uma cruz de madeira pura e percorre os bairros de Poá até o centro.
Mas até chegar no outro palco, a travessia era interrompida por intervenções modernas que faziam analogias para levar aquele espetáculo para além daquilo que se propunha. Fernandes Junior percebeu que o trabalho não era de evangelização prioritariamente, mas também espetáculo de teatro contemporâneo.
Emocionado com a receptividade do público chega no outro palco montado em frente a igreja matriz da cidade. “ Eram senhoras rezando durante a travessia de Jesus, pessoas dando água para o ator para ajudar nessa encenação que era bastante realista e outras apreciando da janela a passagem dele em frente a suas casas” lembra o então extasiado espectador.
Ao fim da apresentação ele decide ir abraçar e agradecer ao Marco Senna e Lidiane Santos pela apresentação. Sempre generosos e com um olhar dividido entre a nítidez de satisfação de uma obra realizada com o saber de ter tratado com atores amadores naquela sensação de que poderia ter ficado melhor, receberam bem os abraços.
Pronto. Mal sabiam eles que estavam alí selando uma parceria que duraria até hoje.
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